Já por muitas vezes tentei escrever sobre este assunto mas as palavras simplesmente não me saíam. Hoje, assim em jeito de balanço pois estou a acabar mais um estágio, desta vez de medicina interna apeteceu-me falar sobre isto.
Há algum tempo atrás, estava a fazer o módulo de Ginecologia/Obstectrícia na MAC e um dos internos com quem estava a assistir a uma cesariana perguntou-me assim disparado:
"Então tu és mais adepta do estetoscópio ou do bisturi?"
E eu que já há algum tempo acho que não tenho dúvidas a esse respeito disse logo muito rapidamente:
"Sou do bisturi, sem qualquer dúvida!"
Pois é! Bastou-me aquele primeiro dia, aquela primeira cirurgia no bloco operatório, aquela cirurgia longa e complicada, 5 horas de pé, sem ver grande coisa que não fosse a azáfama dos cirurgiões e enfermeiros. Bastou-me ver aquela sala de Cirurgia Geral, ver o que se vê nos atlas de ilustrações médicas ali à minha frente, tocar, desinfectar-me, segurar um afastador...Tudo isso fez com que eu me perdesse rapidamente de amores por aquilo, assim como se fosse um amor à primeira vista...
E eu, que nunca pensei muito vir a gostar de cirurgias, dei por mim completamente em pulgas para assistir , a adorar cada momento daquele estágio, a absorver tudo o que me ensinavam. Tive uma sorte imensa com os assistentes por acaso, 5 estrelas! (Tenho tido sorte com isso...)
E por isso fiquei fascinada quando ao ler "A mão que nos opera" descobri que alguém descreveu tão bem aquilo que eu sinto:
" Nem toda a gente aprecia os atractivos da cirurgia. Quando somos estudantes de Medicina e estamos no bloco operatório pela primeira vez e vemos o cirurgião encostar o bisturi ao corpo de alguém e abri-lo como um fruto, ou estremecemos de horror ou ficamos fascinados. Eu fiquei fascinado.(...)a ideia de que uma simples pessoa tivesse autoconfiança suficiente para usar aquele bisturi..."
Pois bem, a Medicina Interna é muito interessante, é o cerne, a essência do que é a Medicina no sentido mais puro. É uma especialidade geral, banalista segundo o meu assistente. Um internista sabe de tudo, sabe aqueles síndromes estranhos que mais ninguém sabe, trabalha que se farta e quando alguém não médico pergunta a um internista qual a sua especialidade e este lhe responde muitas dessas pessoas não sabem o que isso é. O internista é o parente pobre da medicina!
Tenho imenso respeito e admiração por esta especialidade mas para mim não dá. Não dá porque eu não consigo lidar todos os dias com AVC´s, doenças infecciosas como a SIDA e Tuberculose, com pessoas da minha idade a morrer com SIDA, com Insuficiências Cardíacas, com doenças respiratórias, com histórias de partir o coração, com velhinhos abandonados nas enfermarias, com pessoas com tão pouca esperança de vida e na vida. Admiro muito quem consegue, mas eu desde que comecei este estágio ando deprimida e para mim não dá mesmo!